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Brasil 31 de agosto de 2015

Mais dívida e taxas ou menos benefícios?

Cerca de um mês atrás, os economistas Mansueto Almeida, Marcos Lisboa e Samuel Pessôa publicaram um estudo sobre as contas públicas brasileiras, O Ajuste Inevitável, que se tornou objeto de intensa repercussão. Não pelo conteúdo – o estudo não revela nenhuma grande novidade a respeito da nossa dramática situação fiscal e, na essência, consiste de uma tabela que mostra a evolução insustentável dos gastos do Governo nos últimos 20 anos. Não pelo rigor – o estudo deixa de lado, intencionalmente, os repasses do Governo Federal a estados e municípios (destino de gastos crescentes) e a conta financeira (e também crescente) dos juros da dívida. Mas pelo momento em que foi publicado, período em que o país pela primeira vez em décadas poderá viver uma discussão adulta sobre o que espera do Estado e quanto isso pode custar.

No Orçamento que envia hoje ao Congresso Nacional, a Presidente Dilma Rousseff reconhece pela primeira vez um déficit nas contas públicas – e não tentará tapá-lo com receitas artificiais que não existirão, nem com a criação de novos impostos como a CPMF. O descalabro do Estado brasileiro está lá na proposta, como tem estado há muitos anos. A diferença é que, agora, o país não pode mais dar-se o luxo de ignorá-lo. Será preciso que o Legislativo tome uma decisão a respeito. Há apenas três soluções possíveis – e nenhuma delas satisfaz as demandas infantis da população e dos agentes políticos que acreditam no Papai Noel que fabrica riqueza sempre que o país precisa acertar as contas.

A primeira solução é manter o déficit primário, avaliado em pelo menos R$ 30 bilhões pelas contas do Ministério da Fazenda. O risco, nesse caso, é o aumento do endividamento do Estado e a consequente necessidade de captar mais dinheiro no mercado para arcar com a conta de juros. Ela já subiu, de 274 bilhões, em 2014, para algo como R$ 336 bilhões neste ano. Pagar mais significará manter em alta a taxa básica, desestimular investimentos privados e contribuir para prolongar a dolorosa recessão que fez nosso Produto Interno Bruto (PIB) encolher 2% na última estimativa do IBGE. Manter o déficit também significa aumentar o risco de que as agências de classificação de risco rebaixem a nota do Brasil para o grau de investimento especulativo, fato que afugentaria o capital externo e dificultaria ainda mais o cenário para investimentos no país.

A segunda solução é o Congresso fazer o que tem feito nas últimas duas décadas para tapar os rombos nas contas públicas: aumentar impostos. A volta da CPMF foi descartada, mas o Governo sempre foi criativo na hora de inventar novas formas de saciar sua sanha tributária. Entre 1991 e 2014, diz o estudo dos economistas sobre o ajuste fiscal, a carga tributária subiu de 25% do PIB para 35%  período em que a renda subiu 103%, e a arrecadação, quase 184%. Sem fazer nada, apenas com a queda do PIB, a proporção de impostos sobre o PIB já crescerá. Criar novos impostos significaria, portanto, reduzir os recursos disponíveis no setor privado para consumo e investimento e, assim como a manutenção do déficit, prologaria a recessão.

A terceira solução é a mais difícil – e a menos popular. Trata-se de reduzir as despesas para equilibrar as contas. O estudo mostra um crescimento avassalador da despesa primária do governo desde 1991 – ela foi de 11% para 20% do PIB, um aumento de quase R$ 500 bilhões. A maior parte desses gastos ocorreu em políticas sociais, como educação, saúde, aposentadorias e outros benefícios. Só na Previdência Social, uma elevação média de 0,2% ao ano. Apenas neste ano, os gastos com a Previdência subirão de R$ 432 bilhões para R$ 438 bilhões, e a previsão é que cheguem a quase 8% do PIB em 2018. Somando benEfícios como LOAS, seguro desemprego, abono salarial e as diversas bolsas concedidas pelo Estado, todos os gastos sociais cresceram algo como 0,3% ao ano. Só para comparar, os gastos com pessoal e os investimentos subiram menos de um décimo disso, ou 0,02% ao ano. O diagnóstico dos três economistas é que, sem mexer nas políticas sociais, não há ajuste fiscal que se sustente.
Na Avenida Paulista, em São Paulo, manifestantes seguem no sétimo dia de protestos do Movimento Passe Livre
Eles sugerem mudanças na idade das aposentadorias, revisão de Leis trabalhistas e de benefícios assistenciais, além do corte de subsídios. É por isso mesmo que boa parte da população – e dos Congressistas – vê o ajuste fiscal como uma “maldade” feita à custa do bem-estar da população. A crença no Estado como provedor de recursos está tão disseminada no Brasil, que não custa lembrar uma das bandeiras das manifestações populares de 2013 era o passe livre nos ônibus (na foto acima) – como se fosse justo o Estado arcar com o custo de transporte dos indivíduos. A chance de cortes em subsídios e benefícios sociais serem cortados no Congresso Nacional é, portanto, mínima. Políticos agem segundo os humores dos eleitores e de suas bases de interesses – quando não de apenas seus próprios interesses pecuniários.

Nenhuma das soluções será indolor. Mais dívida? Mais impostos? Ou menos benefícios? Eis o impasse em que o país está. Em termos de eficácia, a última solução é a melhor, por ter a vantagem de transmitir um recado claro aos agentes econômicos que poderá contribuir para encurtar a recessão. Em termos de viabilidade, a mais provável é o aumento de impostos ou das dívidas, uma tradição já consolidada em nossa história recente.

Fonte: G1 – Helio Gurovitz

 

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